PERU - Quase uma Bolivia - Cultura Andina

Postado por Babi Silva , terça-feira, 6 de abril de 2010 21:47


Depois de quase 1 semana de descanso em La Paz, parti em direção à Lima, onde iria passar 7 dias em outra conferencia internacional. A conferencia iria ter quase 200 pessoas, mas dessa vez, estava focada em membros da AIESEC que fazem parte da Iberoamerica. Além dos países Latino Americanos, também estariam pessoas dos EUAs, Espanha, Portugal e alguns visitantes de outros países da Europa e Ásia.

Apesar de estar ainda cansada e me readaptando ao fuso horário, estava super animada. Seria uma viagem por terra, com 12 membros da delegação da Bolivia. Seria uma longa viagem e muito tempo para conhecer melhor cada um deles, já que estarei trabalhando com eles, por mais 1 ano. Também estava animada em conhecer um outro país, apesar de já saber que a cultura do Peru é bem parecida com a cultura da Bolivia. Além disso tudo, ainda tinha os reencontros. Na conferencia iria reencontrar amigos feitos durante esses quase 3 anos de AIESEC. Amigos que moram longe e que um dia me despedi sem previsão de reencontros. 
Tirando o susto com a confusão de pessoas em Desaguadero, fronteira da Bolivia com o Peru, a viagem para Lima foi bem mais tranqüila do que imaginava.

A conferencia em si, não teve muita novidade, foi basicamente o mesmo conteúdo passado e criado durante a conferencia da Tunisia, agora retransmitido para os demais membros da Organização. Porém, a conferencia foi muito rica e proveitosa no sentido de relacionamentos. Foi a primeira vez que a AIESEC na Bolivia compareceu à uma conferencia internacional com tanta gente. Éramos 15 representantes da Bolívia. Pude sentir a força de um grupo que tem valores e objetivos comuns e a energia deles em fazer com que AIESEC em seu país seja reconhecida na rede da AIESEC pelo mundo. A AIESEC na Bolivia, em seus 16 anos de história, nunca foi grande conhecida pela rede da AIESEC, por seus baixos números de intercambio e pela baixa participação de seus membros em eventos internacionais. Nisso eles foram vitoriosos e sentia orgulho a cada vez que alguém me contava que tinha vontade de conhecer a Bolivia por ter conversado com algum boliviano e por saber mais sobre a cultura boliviana.

Além disso, os 15 representantes da Bolivia conheceram um mundo de possibilidades. Muitos deles tinham saído da Bolivia pela primeira vez e estar em um ambiente com mais de 25 nacionalidades foi algo único na vida deles.  É muito comum ouvir aqui na Bolivia a desculpa: “É porque somos Bolivianos e Bolivia é pobre”, para justificar, isolamentos, problemas ou condições de vida. Como se Bolivia fosse o único e mais pobre país do mundo e por isso eles seriam obrigados a aceitar essa condição de isolamento do mundo.
Durante a conferencia, os bolivianos ouviram e conheceram outras histórias, outras realidades e outras superações. Perceberam que não são os únicos com problemas no mundo e com isso, perceberam que sim, é possível mudar uma realidade e que a Bolivia tem muita coisa boa. Já percebo a mudança no orgulho, no olhar e na atitude dos que estiveram presentes e minha vontade de “mostrar o mundo” para os demais membros, aumentou. Gerar mais oportunidades para que eles conheçam o mundo. Seja trazendo o mundo até a Bolivia, através dos intercambistas que vêm, seja levando eles para conhecerem outros países.
Delegação de  Bolívia

Depois da conferencia teve o famoso study tour. Porém, dessa vez, decidi pegar o caminho paralelo, mais econômico. O Study Tour é muito prático quando não conhecemos a realidade nem ninguém do país. Nesse caso, já conhecia um pouco a realidade do Peru (bem parecida com a da Bolívia) e percebi que o preço estava muito acima do normal. Além disso, tinha o Juan (Peruano que foi fazer seu intercambio na AIESEC BH e morou quase 1 ano em minha casa) que eu queria muito visitar. Então, aproveitei que o João (amigo da AIESEC BH) tinha ido pra conferencia e programamos juntos um passeio pelo país, incluindo no roteiro, uma passagem por Arequipa para visitar o Juan.

O João tinha 4 dias antes de seu retorno à BH. De Lima até Arequipa seriam 17 horas de ônibus, decidimos ir de avião para economizar tempo e o Juan nos ajudou indicando a Peruvian Airlines, que vendia passagens a 1/3 do valor das outras empresas.  O roteiro seria, Lima - Arequipa – Puno – Arequipa – Lima. Queríamos muito ir à Cusco, mas todos diziam que 1 dia seria muito pouco para conhecer Cusco, mesmo assim decidimos arriscar e então mudamos o roteiro. Lima- Arequipa – Cusco e se desse tempo Puno- Arequipa – Lima. Eu ficaria em Puno, que fica no Lago Titicaca, fronteira com a Bolivia.

Ficamos 2 dias em Arequipa e a cidade me surpreendeu. Quando o Juan me falava da cidade, não conseguia imaginá-la bem. É uma cidade moderna, apesar de tranqüila. É bem parecida com Cochabamba e isso me encantou. É uma cidade plana, cercada por cordilheiras, cheias de jardins e flores. A diferença com Cochabamba fica nos Vulcões que são 3 e rodeiam a cidade e os terremotos que são bem freqüentes. Tem plaquinha verde de “lugar seguro em caso de sismo” em todo estabelecimento ou casa. A grandiosidade dos vulcões me fascinou... Toda a cidade é marcada pelas pedras vulcânicas, explicando o porquê da cidade ser chamada de “ciudad blanca”.  Sua arquitetura colonial também é encantadora. Encantadora. Essa é uma boa palavra para descrever Arequipa. Encantadora também é a família do Juan que nos acolheu tão carinhosamente durante 2 dias. Foi estranho conhecer o lar e a família do estrangeiro que morou em minha casa quase 1 ano, ouvir as histórias e conhecer lugares que foram importantes em sua infância. Agora era ele quem guiava o carro contando historias e mais historias sobre a cidade onde nasceu.
  
Lugar seguro em caso de Cismo(Terremoto)

De Arequipa, seguimos em direção à Cusco com sanduíches  feitos pela mãe do Juan e que seriam nossa principal refeição nas próximas horas. Chegamos a Cusco antes das 6 da manhã e já fomos recepcionados por vários vendedores de passeios turísticos e vagas em hostels da cidade. Esse povo não dorme! O João tentou negociar alguns preços, mas ao final decidimos ir por conta própria. Fizemos uma mochila essencial para passar o dia em Cusco (aprendi bem com o camping no Sahara), compramos nossa passagem para Puno às 23 horas do mesmo dia e deixamos nossas bagagens na empresa de ônibus. Pronto! Já podíamos ir para nossa aventura em Terras Incas.

Mal tínhamos começado a viagem e já estava cansada de negociar. Logo à primeira oferta do taxista, quando percebemos que o preço era maior que o normal, dissemos não e decidimos ir a pé à procura da “praça de armas”, das catedrais e alguns pontos turísticos que tínhamos listado com a ajuda do Juan. Trinta minutos depois de caminhada, às 6:30 da manhã, chegamos à primeira catedral. João aproveitou pra comer um dos sanduíches que a mãe do Juan fez e eu preferi esperar encontrar um café. Visitamos a Catedral, onde é possível entrar de graça até as 10:00 por causa das missas. Depois fomos abordados por mais alguns vendedores de passeios turísticos e decidimos negociar. Já eram quase 7:30 e os passeios começavam às 8:30. Pegamos o roteiro de 1 dia, que iria visitar 3 ruínas Incas do Valle Sagrado. Incluía a visita às ruínas da antiga Cusco, capital do Império Inca. Antes de ir rumo ao Valle Sagrado, decidimos dar mais uma volta na cidade.
Parte com pedras maiores foi construída pelos Incas

Famosa pedra dos 12 ângulos - Acima da base de pedra, construção Colonial

A cidade é marcada pelos restos da cultura Inca e é visível a invasão física e cultural dos espanhóis. As maiores e mais belas construções têm como base as pedras geometricamente ligadas umas às outras sem auxílio de cimento ou outro material dos Incas e a arquitetura colonial dos Espanhóis. Em algumas paredes é até perceptível ver onde foram os Incas que fizeram e onde foram os Espanhóis (Chamados pelos nativos de INCApazes) que fizeram. Eles não conseguiam ligar uma pedra geometricamente à outra e colocavam um tipo de cimento entre elas.  As casas coloniais construídas em cima de bases de construções Incas também são bem numerosas. Um sentimento de vazio, de vontade de ter mais conhecimento e ver construções da época Inca foi enorme. Esse sentimento de vazio me acompanhou durante toda a viagem à Cusco. Visitamos 3 ruínas que foram vilarejos Incas e a cada história que o guia contava, a cada pedaço de construção que víamos, crescia minha vontade de conhecer um pouco mais. De saber o que faziam, como trabalhavam, como se pareciam, como eram as construções originais. Como um povo tão avançado em sua época, que dominou grande parte da América Latina, foi destruído totalmente pelos Espanhóis sobrando apenas um vazio sobre sua cultura e história? E no meio da nossa excursão no Valle Sagrado, nos encontramos com a delegação da Espanha que estava na Conferencia em Lima. Ironico? De repente o João fala: “Você viu os espanhóis?” Sim, consigo vê-los em todos as partes.
Antiga Cusco, Capital do Império Inca
Olha! São os Espanhóis!


À noite voltamos à cidade e fomos a uma pub esperar o horário do ônibus. Tomamos cerveja peruana gelada e fomos para o terminal de ônibus. Antes das 7 da manhã chegamos em Puno, João tinha que chegar em Arequipa até a mesma madrugada para pegar seu vôo pra Lima que sairia às 6 horas da manhã do dia seguinte. Ele resolveu comprar sua passagem para às 16:30. Assim, chegaria em Arequipa antes das 22:00, poderia aproveitar a night de Arequipa com Juan, o que era pouco provável por ser Terça-feira, mas pelo menos poderia descansar bem antes de pegar seu vôo de manhã para Lima.
Como de praxe, assim que descemos do ônibus em Puno, fomos recepcionados por vendedores de passeios turísticos e vagas em hostels. Esse povo começa cedo mesmo!

Como estávamos cansados pelos 2 dias de viagem, decidimos aceitar a oferta do primeiro vendedor. Fomos para um hostel e já compramos um pacote que incluía passeio de barco e visita à comunidade dos Indios Uros, que vivem em ilhas artificiais no meio do Lago Titicaca.

O tour começaria às 9:00, então teríamos quase 2 horas de descanso até lá.  Nesse momento já comecei a sentir os males da altitude. Sai de Lima que está no nível do mar. Fui pra Arequipa, 2500 metros de altitude. Depois Cusco, 3100 metros. Porém, só senti a altitude em Puno com 3800 metros de altitude. Tenho resistência baixa a altura. O João não tinha sentido nada até aquele momento...
Com o mal estar, não consegui comer nada durante toda minha estadia em Puno. Me lembrou minha viagem ao Lago Titicaca no final do ano... O Lago é tão lindo, mas me faz tão mal. Por falar em lindo, o lado boliviano é mais bonito que o lado peruano. A água do Lago Titicaca no lado Boliviano é mais limpa e mais azul, chega a lembrar o mar. Porém o jeito que os peruanos exploram o turismo, melhor, usam o turismo é bem mais saudável que o lado Boliviano. Tanto para os turistas, quanto para os nativos.

Para visitar a Isla Del Sol, no Lago Titicaca, do lado boliviano, tive que pagar pequenas taxas de uso da “terra deles”. Todo o tempo os nativos ficavam pedindo “gorgetas” para contar histórias, gorgeta pra tirar fotos, gorgetas para entrar nos museus, gorgeta para ver praias e lugares. Se não pediam no começo, pediam depois que já tínhamos entrado ou ouvido a história. A cada passo um pedido, mesmo que seja muito pouco(quase nada), essa pedição cansa.  Já do lado peruano pagamos uma taxa e tivemos tudo incluído e se tivesse alguma taxa extra, o guia avisaria com antecedência onde e quanto deveríamos pagar. Daí a gente pagaria se quiser e não seria surpreendido com o pedido no final.

Fomos então visitar os Indios Uros que vivem em Ilhas Artificiais no meio do Lago Titicaca. As ilhas são feitas com uma planta, tipo bambu, muito parecida com a palha de esteira. A planta é resistente a água e é leve. Com ela, eles fazem as ilhas, as embarcações, as casas, os chapéus e ainda por cima comem. São mais de 2mil índios e 200 ilhas na mesma região. O turismo é feito em formato de rodízio. A cada semana, 50 famílias são visitadas e todo dinheiro arrecadado com o turismo é reinvestido na própria comunidade. Com o rodízio, cada família é visitada, no máximo, uma vez ao mês e as visitas acontecem só na parte da manhã. Cada ilha é visitada no máximo por 15 pessoas ao dia. Cada ilha tem um “presidente” que decide como e quando o dinheiro será investido. Essa harmonia e organização é transmitida aos turistas. Quando passamos de barco entre as ilhas, fomos saudados por índios sorridentes.  Quando chegamos à ilha que fomos visitar, fomos recebidos pelas índias que vestiam roupas com cores fortes feitas especialmente para essas visitas. Elas nos ajudaram a descer e nos saudaram sempre com um sorriso no rosto. Os sorrisos não pareceram ser falsos e o guia nos avisou que, se as famílias se sentissem à vontade nos convidariam para conhecer suas casas, se não estivessem num bom dia, não convidariam. Durante a nossa visita eles permitiram no máximo 2 pessoas em cada casa. Eles falam uma mistura de aymara com espanhol. Então deu pra conversar um pouco com a índia que apresentou sua casa pra mim. Ela mora em uma pequena casa de palha com seu marido e suas filhas gêmeas pequenas (que não estavam lá, por causa da visita dos turistas). Me convidou a vestir sua roupa típica, a mesma roupa que as cholitas da Bolivia usam e ofereceu a roupa de seu marido para o João experimentar também. Tiramos algumas fotos. Elas ofereceram  alguns artesanatos para venda e logo depois o guia nos avisou que poderíamos dar um passeio com o barco tradicional, claro que era o custo à parte que ele havia nos informado. Estava passando mal por causa do forte calor e altitude. Desde minha primeira visita ao Lago Titicaca, no Reveillon, morria de vontade de passear num desses barquinhos tradicionais. O Indios Uros vem de uma cultura que antecede a cultura Inca. Estar de novo em contato com o Lago Titicaca foi bem energizante. Tanta energia que chego a ficar esgotada.

Depois do passeio às ilhas artificiais, fomos almoçar. O João já começava a sentir os primeiros sintomas do Sorochi e eu já estava pedindo arrego por causa desses sintomas. João resolveu experimentar Alpaca. Apesar de ser mais leve que carne de boi ou porco, preferi ficar na sopinha de tomate,meu menu principal sempre que estou no Lago Titicaca.

Uma coisa que me chamou bastante atenção em várias cidades do Peru, foi o uso dos Rickshaws, aqueles triciclos muito usados como transporte na Índia. Decidimos tomar um desses na hora do João ir embora. Depois que deixei o João no terminal de ônibus, voltei para o Hostel de rickshaw e passei o resto do dia e noite descansando. Na manhã seguinte segui viagem para Copacabana, lado boliviano do Lago Titicaca. A fronteira entre Peru e Bolivia aí, é bem mais tranqüila e bonita que a fronteira por Desaguadero. Passei algumas horas em Copacabana, que me traz boas lembranças do réveillon e em menos de 3 horas estava em La Paz. Fui para a casa do Andrés, pegar parte da bagagem que deixei la pra ir ao Peru e em pouco menos de 10 horas já estaria de volta em Cochabamba. Depois de quase 2 meses viajando estaria de volta ao meu lar atual...

Viajar pelo Peru que tem uma cultura Andina, bem parecida com a da Bolivia e estar ao lado de pessoas queridas e falando português, aliviou um pouco a saudade que estava sentindo de casa. 

2 Response to "PERU - Quase uma Bolivia - Cultura Andina"

Rob Says:

E muito legal ler sobre o desenvolvimento da AIESEC na Bolivia - parabens!

Beijos e saudades