Incredible India II - Varanasi e o Rio Ganges

Postado por Babi Silva , terça-feira, 5 de outubro de 2010 01:36

Durante a Conferencia Internacional, encontrei a Leticia, amiga da AIESEC em BH, que está fazendo seu intercambio na Tata em Delhi, desde o inicio do ano. Desde que soube que ia pra India, já estava programando com ela uma viagem para conhecer melhor o país... Porém, demoramos tanto decidindo o destino que as opções foram ficando cada vez mais caras. Por fim, 2 dias antes da Conferencia terminar, decidimos (ela decidiu) que íamos para Varanasi. Ok... Eu, com meu conhecimento limitado de India, apenas perguntei o que tinha de interessante por lá. “O Rio Ganges”, ela disse. Uhm...interessante...

Sempre quis conhecer o Rio Ganges, mas confesso que não era, necessariamente, meu objetivo na India. Eu queria ir à um lugar onde houvesse elefantes, queria ir numa cidade que tivesse a “verdadeira India” sem máscaras pintadas para turistas e, claro, ver o Taj Mahal. Nesse sentido Varanasi prometia encaixar-se bem em minhas expectativas.


Se India é incrível, posso dizer que Varanasi, além de incrível é IMPRESSIONANTE.
*Impressionante: Aquilo que impressiona; que causa comoção; que abala; que perturba; que alvoroça; que enternece (Michaelis)


Depois de 4 horas voando numa companhia aérea doméstica, que “só dava passageiros estranhos”, segundo estatísticas da Lets, chegamos em Varanasi. Durante a viagem a Marina, ex-coordenadora da Lets, na TATA e que nos acompanhava na aventura, nos disse que as pessoa iam para Varanasi morrer, pois lá era um bom lugar para morrer. Olhei pra Leticia e comecei a rir sem parar... Ok, agora não tem tanta graça, mas na hora não pude segurar a crise de riso. Ainda mais depois que a Leticia disse: “Uai, pensei que fosse por causa da companhia aérea”. Realmente o voo estava cheio de passageiros doentes e muita, mas muita gente anciã.

Logo depois que chegamos ao minúsculo aeroporto, que deveria ter no máximo 30m²  ou 2 salas-de-estar, fomos buscar um taxi para nos levar até o centro da cidade...

Os taxistas nos avisaram que não entrava carro na cidade. “Que legal, deve ser igual Veneza”, exclamou Leticia... Uhum, vamos ver essa Veneza Indiana...

Assim que chegamos nos limites da cidade, percebemos que Varanasi mais parecia uma favela que Veneza... Depois de 15 min caminhando com minha mala gigante, por entre becos com esgoto a céu aberto, vacas e muita sujeira, seguindo um pequeno, velho indiano que nos insistia em indicar o caminho, chegamos em nosso hostel ou Guest House, como é mais conhecido por aqui.  Meu primeiro pensamento foi “O que eu vim fazer aqui?”... Ok ,vivamos a diversidade! Minha mala é muito pesada  e grande pra eu  ir embora agora... O que me motivava era saber que ficaria ali apenas 2 dias. O hotel até que era bonitinho e no final saiu suuper barato :18US por 2 dias, em um quarto triplo com banheiro(normal) privado e com Ar condicionado. O AC no quarto deu uma super mega valorizada no serviço do hotel =)

Estávamos famintas. Por isso decidimos deixar as malas no quarto e subir para o ultimo andar do hotel, onde havia um restaurante... Subindo as escadas para o restaurante, sentimos cheiro de churrasco e já gritamos: “Obaaaa carne de vaca, finalmente!”... Apressamos o passo e quando chegamos lá em cima, nada de churrasco... Ok, pode ter sido a fome nos enganando, pensei. Sentamos à mesa e fizemos nosso pedido... O hostel ficava à 2 quadras do Rio Ganges e mesmo sendo noite, podíamos perceber a grandiosidade do Rio... À margen do rio havia um grande templo Hindu e desse templo saía uma enorme fumaça... Ouvíamos uma música que vinha do templo e alguns cânticos, era aniversário de Krishna... Tive vontade de descer, mas olhando pra baixo, só via um emaranhado de casas, becos e pequenos templos. É como olhar uma favela de cima. Por isso, achamos mais seguros ficar no hotel.

Poucos minutos depois, o cheiro de churrasco voltou. Nos olhamos e ficamos chocadas por alguns segundos sem conseguir acreditar no que estávamos sentindo. Será? Não, não pode ser... Sim, é isso mesmo que estamos pensando. OMG! O cheiro que estávamos sentindo era da fumaça do templo, que na verdade era o maior crematório de Varanasi. Sim, eles estavam queimando corpos! Desde então, não consigo comer carne vermelha, pois só de sentir o cheiro tenho enjôos e me lembro do cheiro daquela noite.

No dia seguinte, fomos conhecer melhor a Veneza Indiana.  Até que durante o dia, sem o cansaço e a mala gigante, consegui perceber melhor as peculiaridades da cidade. A cada passo uma surpresa, vendas, restaurantes, casas, templos, tendas que vendiam garrafas vazias para levar a água sagrada do Ganges pra casa, peregrinos hindus, tudo muito real, nada turístico... Tudo seguindo seu ritmo natural e claro, suas centenas de vacas dividindo as ruelas com os tantos transeuntes. Tantas cores, cheiros e sensações causadas também pelo calor intenso e a alta umidade do ar.   Entramos num discreto café para tomarmos nosso café da manhã. mesas baixas e grandes bancos confortáveis... muitos tapetes, centenas de chás, incensos e outras especiarias indianas nas prateleiras, o ambiente era preenchido pelos cheiros e uma suave música Hindi ao fundo.  “Caramba! Estou na India!”  Sai do café com muita energia de conhecer melhor aquele lugar tão sagrado, tão especial.

Varanasi é uma das cidades mais antigas do mundo. Tem mais de 5 mil anos, foi bem perto dali que o Buda pregou pela primeira vez há muitos séculos atrás. É a cidade sagrada dos Hindus, às margens do sagrado rio Ganges. Em Varanasi existem dezenas de Gaths (umas escadarias que desembocam no Rio) onde os Hindus tomam seu banho sagrado, lavam roupas, rezam, e também cremam gente. Sim, várias das gaths são crematórios. Morrer em Varanasi é o sonho de todo Hindu.

Gaths

Logo depois do café da manha, fomos a uma das maiores Gaths negociar um barco que pudesse nos levar a um passeio pelo Rio Ganges. Depois de muita negociação, da Leticia, usando e abusando do seu Hindu básico/intermediário, subimos numa embarcação sem motor, que nos levaria pelas principais gaths da cidade. O rio Ganges é um dos rios mais poluídos do mundo. Também é um dos mais sagrados. Apesar disso, fiquei assustada ao ver crianças, jovens e anciãos dentro do rio, colocando um pouco de água em garrafas, rezando ou até mesmo bebendo! Lindos templos ao lado de cada uma das Gaths.



Ficamos admirando aquela cultura intrigante até que chegamos numa Gath crematório. Fotos são proibidas e o que pude ver foi uma pequena fogueira. Não nos aproximamos muito e ficamos ouvindo nosso guia explicando o ritual. Normalmente a cerimônia é acompanhada apenas pelos homens. Segundo ele, “é um ritual muito forte para as mulheres”. Depois disso, ele nos perguntou se queríamos conhecer o templo onde há o maior crematório da cidade. Claro que isso teria um custo adicional no passeio. Perguntamos a distancia e a direção e percebemos que era o tal crematório que fica muito próximo ao nosso hotel. Decidimos aceitar a oferta e lá fomos nós conhecer o mais famoso crematório Hindu da India.
Ao fundo o maior crematório de Varanasi

Ao chegarmos à Gath, tivemos que pedir licença aos zebus que se banhavam à margem do rio. Subimos ao templo e logo fomos recepcionadas por um guia. Ele nos convidou a entrar dizendo que não cobraria por nada, pois é um lugar sagrado e que gostaria de mostrar sua cultura pra gente... Aham, senta lá Claudia.


Mesmo sabendo que era papo de bom negociante Indiano, o seguimos. O templo é realmente muito grande, existem pilhas e pilhas de madeira e ele nos explicou que o quilo da madeira é muito caro, por isso nem todos tem o privilegio de serem cremados. Ele nos explicou que quando um Hindu é cremado em Varanasi, ele acaba com seu karma, não necessitando assim, voltar em outras vidas para pagá-los. Os corpos dos seres puros, como os bebês, as mulheres grávidas e as vacas são jogados diretamente ao rio sem necessidade de cremar.

Do alto pudemos ver o ritual da cremação. O corpo é embalado em panos dourados e prateados e banhado ao rio. Logo depois, eles colocam o corpo em cima de uma pilha de madeiras, e mais madeira em cima do corpo. No crematório que estávamos, são cremados de 300 a 400 corpos por dia. Funciona 24 horas.
Depois de 3 hora cremando as cinzas são jogadas no rio. O mais chocante foi ver a falta de pudor dos Hindus ao nadarem ao lado de onde se jogam cinzas. Ainda bem que de perto, não senti o tal cheiro de churrasco... Acho que é só a fumaça que tem esse cheiro mesmo.

Claro que ao final do passeio o nosso pequeno guia nos cobrou uma doação de apenas 250 rúpias, para que as pessoas pobres pudessem ser cremadas.  Esse foi o valor foi mais do que cada um de nós pagamos por ter 2 horas de passeio de barco no Rio Ganges. Um abuso. Resolvemos pagar 100, mesmo sabendo que já era um preço abusivo. De la, fomos conhecer melhor a cidade, no caminho cruzamos com muitos cortejos fúnebres...

Queríamos conhecer o Golden Temple, um templo hindu construído com muito ouro... Assim como para entrar em outros edificios públicos da India, para entrar no templo dourado, tive que passar por detectores de metais, revistas e ser seguida pelos olhos de muitos policiais. Passeamos por entre o templo, mas como não éramos Hindus, não pudemos entrar...

Duas vezes ao dia acontece a cerimônia em homenagem ao rio Ganges. Uma acontece às 5 da manhã e a outra às 7 da noite. Tentamos na primeira manhã ver essa das 5, mas não pudemos levantar...Fomos às 7 da noite mesmo. Chegamos à Ghat onde iria ter a cerimonia e negociamos o preço de assistir sentados num barco. Assim, poderíamos ver a cerimônia de frente. À medida que caminhávamos em direção à Ghat, vários sacerdotes ofereciam bênçãos, colocando uma tinta vermelha em nossa testa... Outra dezenas de mulheres e crianças nos vendiam barquinhos de flores com velas dentro para que pudéssemos libertá-las com um pedido ao rio Ganges. A cerimônia é bem bonita, com tambores, vários instrumentos musicais, cânticos e fogos.
Cerimonia do fogo em homenagem à Ganga
Para vídeo clique aqui


No dia seguinte pedimos para o senhor do Hotel chamar alguém que pudesse nos ajudar com as malas... Arrastar aquela mala gigante por aquelas ruas é que eu não iria fazer mesmo. Foram as 100 rúpias mais bem pagas na India.  De lá seguimos, pelas ruas da Nova Varanasi, numa incrível corrida de rickshaw para a estação onde pegamos um trem para Delhi. 17 horas de viagem. Na estação, vacas se misturavam aos passageiros e às vezes, realmente pareciam que estavam esperando o trem...

Vaquinhas na Estação (Para ver o vídeo, clique aqui)
Leticia, amiga e companheira de viagens, querendo me mostrar “the real India”, em lugar de comprar tickets na 2ª classe, que custaria menos de 20US, nos comprou classe “sleeper” que custou menos de 2,00 US.
Ok, sem problemas... Afinal, quem é que queria viver a verdadeira India? A classe sleeper é dividida em cabines (abertas) onde existem 3 camas de cada lado da cabine e uma cama oposta à cabine. Então, se tivéssemos sorte, iríamos sozinhas ou com no máximo outras 4 pessoas.


Logo que entramos, percebemos que iríamos ter 2 companheiros. As primeiras 2 horas de viagem foram tranqüilas. Eu lia a biografia do Gandhi que eu comprei em Mumbai, enquanto a Marina e a Leticia se distraiam conversando com um dos indianos, tentando explicar onde o Brasil ficava no mapa. Os Indianos adoram estrangeiros e possuem uma curiosidade interessante. É bem comum perguntarem coisas muito pessoais, antes mesmo de perguntarem seu nome. Nosso amigo indiano desceu em uma das estações, onde o trem resolveu demorar mais do que o necessário. Normalmente o trem fica parado no Maximo 20 min. Nessa estação esperamos por mais de 1 hora. Resolvemos almoçar o lanchinho que levamos. Eu comi minha Cheese Parantha (tipo de pão/panqueca com queijo)que pedi no hotel... Conversamos, tiramos fotos e nada do trem sair. Resolvi voltar para meu livro, Leticia resolveu subir pra cama dela, que ficava quase perto do teto do trem e a Marina resolveu tirar um cochilo. Fiquei concentrada no meu livro, quando percebi um burburinho vindo à nossa frente. Quando levantei a cabeça, onde havia antes apenas 1 indiano, haviam mais de 15. Todas se aglomerando em cima do pobre que estava sentado em sua cama/cadeira. Dos corredores haviam outros tantos indianos em pé, conversando e rindo, enquanto nos apontavam. Foi aí que percebi que estavam lá por nossa conta. Claro, não é todo dia que eles vêem 3 estrangeiras, sem a presença de nenhum homem na classe sleeper. Quando olhei pra janela, haviam outros tantos indianos me olhando. E a coisa só foi piorando. Chamei a Leticia que com seu Hindu, começou a pedir que eles se retirassem. Como não surtia muito efeito, tivemos que chamar o maquinista, que espantou alguns, mas não todos os curiosos. Então, ele resolveu chamar os policiais que vieram com enormes armas de madeira que tenho certeza que erão da época da colonização britânica na India. Os guardinhas ficaram la nos olhando até que o trem saísse de novo. Na hora ficamos assustadas, mas até que foi divertido. Hehehehe
A gente no trem...Olha a arma do policial
Para ver o vídeo clique aqui



Depois de 17 horas de viagem, chegamos em Delhi. Ficaria em Delhi tempo suficiente para descansar, reencontrar pela última vez, os amigos da conferencia que já estavam por lá e claro, organizar minha viagem para a tão famosa Agra, onde fica o Taj Mahal. Ainda faltavam os Elefantes... Então fiz um malabarismo com o tempo para conseguir conhecer Delhi, Agra (Taj Mahal) e Jaipur, a cidade cor de rosa, onde haviam os famosos elefantes. Essas 3 cidades também são conhecidas como triangulo de ouro e fiquei bem feliz em saber que poderia visitá-las em 2 dias e meio e tomar um avião para Mumbai onde pegaria meu vôo de volta para o Brasil. Porém, detalhes dessa viagem ficarão para o próximo capítulo.

Ao final, não sei explicar meus sentimentos quanto à minha viagem à Varanasi. Impressionada, é como consigo me descrever... Uma impressão que ficou marcada em minha mente e coração até hoje. 

Varanasi é uma das cidades mais especiais que conheci até hoje. Talvez seja a incrível história, o misticismo, tranqüilidade, jeito de ver e encarar o outro lado da vida, contrastada ao jeito indiano de viver coletivamente, sem se preocupar muito com o conforto e organização da vida ocidental e modernidade, fora o respeito aos animais e a natureza (apesar do rio poluído). Não sei explicar... Só sei que ao final tinha um misto de sentimentos...
Vontade de sair logo e ao mesmo tempo ficar... Varanasi me ensinou muito sobre desapego e até mudou um pouco meus hábitos diários... 











3 Response to "Incredible India II - Varanasi e o Rio Ganges"

pelosolhosdevesgo Says:

êÊÊ blog precisando de uma atualizada heim??
hehe

Unknown Says:

Olá!

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Anônimo Says:

Fiquei admirada de vc ir para Varanasi e nao ter pesquisado sobre a cremação de corpos.

Sobre o indianos no trem, vocês deveriam estar de regata ou mostrando o joelho alguma coisa assim, será que não? Por isso que antes de ir para qualquer país vc tem que pesquisar e saber bem qual a cultura deles para saber onde está pisando.